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A Superintendência Regional do Incra na Paraíba (Incra/PB) concluiu a
primeira etapa da regularização da Comunidade Quilombola Engenho Mundo Novo,
localizada a cerca de 122 km de João Pessoa, no município de Areia –
tradicional região de engenhos de cana-de-açúcar no estado. O resumo do
Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) da comunidade foi
publicado nesta terça-feira (14) no Diário Oficial da União (DOU).
O trabalho técnico, o primeiro passo no processo de regularização da
comunidade de 37 famílias (cerca de 130 pessoas) identificou o território em
uma área de aproximadamente 322 hectares. O RTID é produzido por uma equipe
multidisciplinar e reúne informações sobre a história, a ancestralidade, a
tradição e a organização socioeconômica das famílias.
A antropóloga Maria Ester Fortes, do Serviço de Regularização de
Territórios Quilombolas do Incra/PB, afirmou que o RTID é uma peça chave no
processo de regularização fundiária das comunidades quilombolas.
“O RTID é composto pelo relatório antropológico, que aponta os aspectos
históricos e socioculturais da comunidade, bem como a relação deles com o
território a ser delimitado, e ainda pelo Laudo Agronômico e Ambiental, pelo
levantamento dominial do território, pelo cadastro das famílias pertencentes à
comunidade e pelo Mapa e Memorial Descritivo da área”, explicou Maria Ester.
O relatório antropológico do RTID da Comunidade Quilombola Engenho
Mundo Novo foi produzido pelos antropólogos Rodrigo Domenech e Adrian Ribaric,
através de contratação feita pelo Incra Sede.
Os próximos passos para a regularização do território da comunidade são
a publicação do decreto de desapropriação pela Presidência da República e a
avaliação da área pelo Incra, para definir o valor da indenização do
proprietário. Após a desapropriação, o Incra será imitido na posse do
território delimitado e será concedido um título coletivo e inalienável de
propriedade à comunidade em nome de sua associação dos moradores.
Moradores livres e descendentes de escravos
De acordo com informações do relatório antropológico do RTID da
Comunidade Quilombola Engenho Mundo Novo, ela é formada por descendentes dos
primeiros trabalhadores da antiga fazenda Engenho Mundo Novo que, após a morte
do proprietário e a desestruturação do imóvel, permaneceram nas terras onde
nasceram e nas quais vivem e trabalham há pelo menos quatro gerações. A fazenda
era composta por grande área de plantio de cana-de-açúcar, de pasto para a
criação de animais de tração (boi, cavalos e muares), pela casa grande –
complexo que contava com diversas edificações –, e pelo engenho propriamente
dito, além da área destinada para habitação e subsistência dos trabalhadores.
Alguns moradores se estabeleceram nas terras dos engenhos da família
como moradores livres, outros são descendentes de antigos escravos que
pertenciam à família e trabalhavam em seus engenhos de rapadura e aguardente,
sobrevivendo da agricultura e pecuária de subsistência praticada em pequenos
lotes.
Atualmente, as famílias vivem do que plantam e do pouco que conseguem
vender na feira da cidade e complementam a renda prestando serviços braçais nos
sítios e fazendas do entorno. Os mais jovens buscam trabalho em outros
municípios. A maior parte das famílias possui quintais, onde cultivam
frutíferas, temperos eervas e criam animais de pequeno porte, mantém plantios
tradicionais, como milho e feijão, e criam poucas cabeças de gado por conta
própria ou em parceria com outros sitiantes das redondezas.
Ainda segundo o relatório antropológico, a escassez de espaço para a
agricultura é o principal responsável pelas precárias condições de vida
verificadas no estudo, fato agravado pelo contexto histórico de formação da
comunidade e pela situação conflituosa com os herdeiros da propriedade. Após a
desestruturação da fazenda, as famílias ficaram restritas a uma área
descontínua de 93,5 hectares correspondente à soma da área dos sítios
familiares garantidos liminarmente através de ação de manutenção de posse
ajuizada na 4ª Vara Federal de Campina Grande.
Não há escola, posto de saúde, serviço de transporte público ou coleta
de lixo. Apenas recentemente foi estabelecido o serviço de transporte escolar
que encaminha os alunos locais até a escola na localidade vizinha de Jitó dos
Ferreira e às localizadas na sede municipal. A água é coletada em cacimbas e
transportada em baldes, não há esgotamento sanitário e muitas casas não possuem
energia elétrica.
As habitações, construídas há mais de 50 anos pelo então proprietário,
são, em sua maioria, feitas de tijolos cozidos e cobertas de telhas de barros e
encontram-se em más condições de conservação, além de serem em número
insuficiente para abrigar adequadamente toda a comunidade.
A comunidade foi reconhecida como remanescente de quilombo pela Fundação
Cultural Palmares em Outubro de 2009, quando também foi aberto o processo de
regularização fundiária do seu território junto ao Incra.
Processo de Regularização Quilombola
As comunidades quilombolas são grupos étnicos predominantemente
constituídos pela população negra rural ou urbana, que se autodefinem a partir
das relações com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as
tradições e práticas culturais próprias. Estima-se que em todo o país existam
mais de três mil comunidades quilombolas.
Cabe às comunidades interessadas encaminhar à Superintendência Regional
do Incra do seu estado uma solicitação de abertura de processo de regularização
de seus territórios. Para início dos trabalhos, a comunidade deve apresentar a
Certidão de Registro no Cadastro Geral de Remanescentes de Comunidades de
Quilombos, emitida pela Fundação Cultural Palmares.
A partir daí, o Incra realiza um estudo da área, destinado à elaboração
do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) do território. A
segunda etapa é a de recepção, análise e julgamento de eventuais contestações.
Aprovado em definitivo, o RTID instrui a publicação de uma portaria de
reconhecimento que declara os limites do território quilombola.
A fase seguinte do processo administrativo corresponde à regularização
fundiária, com desintrusão de ocupantes não quilombolas mediante desapropriação
e/ou pagamento de indenização e demarcação do território. O processo culmina
com a concessão do título de propriedade à comunidade, que é coletivo, em nome
da associação dos moradores da área, registrado no cartório de imóveis, sem
qualquer ônus financeiro para a comunidade beneficiada.
Segundo a presidente da Associação de Apoio aos Assentamentos e
Comunidades Afrodescendentes da Paraíba (Aacade/PB), Francimar Fernandes, 37
comunidades remanescentes de quilombos na Paraíba já possuem a Certidão de
Autodefinição expedida pela Fundação Cultural Palmares.
Ascom/Incra
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